
Pensei, porque é que com tantas mulheres, o corpo se encarrega de fazer a expulsão...e com outras nada acontece? Decidi ir para casa, com a primeira parte da medicação já colocada, Cytotec. A médica deu-me a possibilidade de ficar com ela no Hospital, mas ao mesmo tempo demonstrou que estaria melhor no conforto da minha casa, da minha cama. Disse que estaria ali a dois passos e qualquer coisa o meu marido levar-me-ia até ela. Sei que muitas mulheres, pela sua experiência preferiram ficar no hospital, mas penso que foi o melhor que fiz , vir para casa.
Duas horas depois começaram os arrepios de frio no corpo todo e as chamadas "contracções". Uma dor que me apanhava desde a barriga até aos rins. E já tinha tomado Nolotil para amenizar as dores... Passadas 6 horas nada de perdas e coloquei a restante medicação que levava. A febre subiu aos 38,7º, os arrepios, as contracções e nada de perdas. Passadas 11horas da primeira toma, começaram as perdas, e acabou por sair um pequeno coágulo. Senti-me mal, o marido teve de me agarrar e ajudar a voltar para a cama. Não tinha posição para estar e o medo de sentir a expulsão do saco, tomava conta de mim... era o meu sonho a ir embora....verdadeiramente....
Mas nada...passou-se a noite,e no dia seguinte liguei à GO e expliquei que as perdas diminuíam e ela mandou-me ir ter com uma colega dela ao Hospital, que estava de banco. O tempo que estive sentada à espera foi muito difícil...estava numas urgências de Ginecologia/Obstetrícia, o que é que lá mais encontramos? Grávidas...muitas....não sei quantas vezes me começaram a cair lágrimas e que as tentei conter... A médica que me atendeu, fez nova eco e disse que o saco se mantinha bem agarrado, e que tinha de tomar mais medicação. Pediu que a seguisse para me passar a receita, e levou-me para a sala onde estavam 3 grávidas a fazer o CTG...coraçõezinhos a bater....e eu ali, presa ao fim de um sonho, a sofrer, e a médica a mandar uma mensagem no telemóvel em vez de me despachar rapidinho para eu sair dali!
Percebi que quando passamos por esta situação não somos nada, nem peixe nem carne, não somos grávidas, mas somos tratadas ao lado delas, mas não existe qualquer sensibilidade com a nossa condição, com o nosso sofrimento. E percebi também que se tivesse decidido ficar internada naquela 2ª feira, teria ficado lado a lado com as grávidas que esperavam pela hora do parto...horas a fio....
Fui para casa e fiz nova medicação, mais arrepios, dores...e nada de perdas. Durante a noite voltei a colocar a medicação e pela hora de almoço estava tudo na mesma. Liguei à GO para saber se deveria continuar a colocar medicação. Ela pediu que fosse ter com ela à Clínica onde estaria à tarde e veríamos através da eco como é que eu estava.
Fui ter com ela, e na eco viu que o saco já tinha descido e o colo do útero estava a abrir. Não consigo descrever as dores que senti nos momentos que se seguiram, mas uma coisa sei, percebi que tenho uma resistência à dor muito superior ao que eu sequer imaginava. A médica rebentou o saco, e só me lembro de ter respirado fundo, fechado os olhos e pensar que não queria voltar a passar por aquilo...naqueles momentos disse para mim que não queria voltar a engravidar...a GO conseguiu puxar o saco inteiro, ali....depois de todas aquelas dores só conseguia agradecer à médica, sei que não seria qualquer GO a tomar aquela decisão, de o fazer naquele momento. Mas a verdade é que me poupou de mais medicação, de mais agonia, de sentir a expulsão em casa.
Naquele momento, senti que poderia finalmente descansar, repousar...e começar a fazer o meu luto. A dor física passa, mas a dor psíquica fica, e não se esquece. Mulher nenhuma deveria passar por este sofrimento, é uma dor tão grande no peito, que não consigo descrever...nunca esquecerei este anjinho que bateu dentro de mim, não há nada que nos possa fazer esquecer isso...
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